2018/08/08

Oração

"Portanto, vós orareis assim: Pai nosso, que estás nos céus, santificado seja o teu nome; venha o teu reino; faça-se a tua vontade, assim na terra como no céu; o pão nosso de cada dia dá-nos hoje; e perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nossos devedores; e não nos deixes cair em tentação; mas livra-nos do mal, pois teu é o reino, o poder e a glória para sempre. Amém!" (Mateus 6:9-13).

Uma das orações mais conhecidas no mundo é a oração do Pai Nosso, a qual Jesus nos ensinou. Em todo o mundo ela é recitada por milhões de cristãos e muitas pessoas a têm memorizado para que eles possam recitá-la frequentemente, mas, não importa quão bela ela seja, ela não foi dada para este propósit de usarmos essa oração como um amuleto de sorte ou proteção. De fato, após Jesus a dar, ninguém no Novo Testamento a recitou –– nem mesmo o próprio Jesus (João 17)!

Os discípulos não pediram para Jesus ensiná-los uma oração, mas para ensiná-los como orar (Lucas 11:1). Há uma diferença significativa.

Jesus precedeu Sua oração dizendo, "Portanto, vós orareis assim" (v. 9), que literalmente significa, "Orem ao longo destas linhas". Sua oração era um padrão geral para todas as orações, e embora ela não seja recitada, seus princípios estão evidentes em todas as orações do Novo Testamento.

A oração modelo de Cristo nos ensina a pedir seis coisas a Deus:

(1) que Seu nome seja honrado,

(2) que Ele traga o Seu reino à terra,

(3) que Ele faça Sua vontade,

(4) que Ele proveja nossas necessidades diárias,

(5) que Ele perdoe os nossos pecados,

(6) que Ele nos proteja de tentação.

Cada uma dessas contribui para o objetivo último de toda oração, que é trazer glória a Deus. As últimas três são os meios pelos quais as três primeiras são alcançadas. À medida que Deus providencia o nosso pão diário, perdoa os nossos pecados e nos protege quando somos tentados, Ele é exaltado em Seu nome, glória e vontade. Se você entender e seguir o padrão de Cristo para a oração, você pode estar seguro que estará orando como Ele instruiu, e que, seja o que for que você peça em Seu nome, Ele fará, "para que o Pai seja glorificado no Filho" (João 14:13).

"A oração não se mostra verdadeira quando Deus escuta o que se lhe pede. Ela é verdadeira, quando quem ora continua orando, até que seja ele mesmo a escutar o que Deus quer. Quem ora de verdade, nada mais faz senão escutar."

Se você quiser saber o conceito que um povo tem de Deus, preste atenção nas suas orações e nos seus cânticos. Pois é impossível ter um conceito correto de Deus revelado nas Escrituras e orar, cantar e adorar de maneira errada. Como sabemos, a teologia precede a ética, ou seja, o nosso comportamento, os nossos valores e prioridades são reflexos ou expressões do conceito que temos de Deus e da vida. Portanto, quanto mais conhecermos pelas Escrituras o Deus que se revelou na Pessoa de Jesus Cristo, quanto mais conhecermos o seu ser, os seus atributos, isto determinará a nossa maneira de orar, cantar e adorar a Deus.

Pode-se questionar: Seria possível adorar de maneira errada? Jesus disse que sim. Quando do seu encontro com a mulher samaritana, ele afirmou: "Vós adorais o que não conheceis." Jo 4:22.

Creio que um dos atributos de Deus que permeia todos os demais e que determina nosso relacionamento com Ele, através da oração e cânticos, é a soberania de Deus. Entretanto, a tendência hoje no meio cristão, é engrandecer o homem e degradar a Deus, chegando mesmo quase a divinizar o homem e humanizar a Deus. Pregamos um Deus limitado pela autonomia humana. Esta luta teve origem no Éden, quando Satanás fez o homem duvidar da palavra e do caráter de Deus. O homem perdeu o conceito correto da soberania de Deus, perdeu a visão de Deus como criador, e dele como criatura, levando-o a acreditar que poderia ser como Deus, que ele também é um ser autônomo. Essa luta entre o teocentrismo e o antropocentrismo, tem permeado toda a história humana. Basta que prestemos atenção na maioria dos livros evangélicos escritos sobre oração, na maioria dos sermões pregados nas igrejas, nas letras dos cânticos, que iremos comprovar a triste realidade da centralidade humana.

Uma reciclagem necessária. A soberania de Deus sempre foi o tema central de toda a bíblia. Seu primeiro versículo proclama esta verdade: "No princípio criou Deus."

A soberania de Deus sempre foi o tema de Paulo, Agostinho, dos pré-reformadores, dos reformadores, Lutero, Calvino, Zuinglio, sempre foi tema dos puritanos, e o tema central da teologia reformada. Portanto, somente uma reciclagem nesta verdade suprema poderá mudar nossas mentes, nossos conceitos, e consequentemente, nossas orações e cânticos. É de suma importância que aprendamos a orar e cantar com a Bíblia. Jesus ensinou os seus discípulos a respeito do plano eterno e soberano de Deus, faça-se a tua vontade, e eles passaram estas verdades aos primeiros cristãos. Paulo sempre orava para que o Espírito Santo abrisse os olhos espirituais dos irmãos, dando-lhes sabedoria para compreenderem a vontade de Deus. Os textos demonstram claramente que a visão que Paulo possuía da soberania de Deus e do mistério que lhe fora revelado, determinavam suas orações.

Como oravam os pais da igreja? A história da igreja é testemunha de irmãos que através dos séculos, deixaram registradas suas orações manifestando de forma maravilhosa, esta visão correta a respeito de Deus e seu propósito. Eles sempre oravam para conhecer mais a Deus e pediam graça para realizar a sua vontade.

Dificuldades no aprendizado Hoje temos muita dificuldade para aprender a orar. Achamos que por sabermos falar, sabemos orar; e muitas vezes, nossas orações se assemelham mais as orações dos gentios. "gentios que não conhecem a Deus, e pensam que pelo muito falar serão ouvidos." Mt 6:7,8.

A falta de revelação de quem é Deus, e quem somos nós, nos conduz a grandes erros na oração. Ouça o conselho de Salomão em Ec 5:2: "Não te precipites com a tua boca, nem o teu coração se apresse a pronunciar palavra alguma diante de Deus; porque Deus está nos céus, e tu, na terra; portanto, sejam poucas as tuas palavras."

Pior do que não orar é orar errado, é mais fácil ensinar quem não sabe orar do que quem já aprendeu errado. Bonhoeffer, "Orar não significa simplesmente derramar o coração, mas significa encontrar-se com o coração saturado ou vazio, o caminho para junto de Deus," e só conseguiremos isso através de Jesus. É por isso que oramos ao Pai em nome de Jesus. Mas, o que significa orar em nome de Jesus? Para muitos, o nome de Jesus é uma senha que abre os cofres do céu, ou uma chave que abre o coração de Deus. O nome de Jesus se torna como que uma "fórmula mágica".

Na realidade, a falta de um entendimento correto do que significa orar em nome de Jesus, tem sido fator determinante de tanta confusão com respeito a oração. Orar em nome de Jesus é orar a vontade dele, e orar a oração dele, é orar junto com Ele.

Nossas orações devem ser consequência da palavra de Deus que deve habitar ricamente em nosso coração desordenado. Devemos sempre nos perguntar:

·         Jesus faria a oração que estou fazendo?

·         Será que estou orando em seu nome, ou em meu próprio nome?

·         As minhas orações são antropocêntricas ou Teocêntricas?

·         Estou desejoso de que o nome de Deus seja santificado na terra? Que o seu reino cada vez mais seja uma realidade cada vez maior em minha vida, em minha casa e na sua igreja?

·         Estou desejoso de que a sua vontade seja manifestada através da vida do seu povo aqui e agora?

Quando examinamos nos evangelhos a vida de Jesus, percebemos que este sempre foi o seu desejo, a santificação do nome do seu Pai, a manifestação do Reino de Deus na terra, e chegou mesmo a afirmar que a sua comida e a sua bebida era fazer a vontade de Deus. A eficácia da nossa oração, não está na quantidade de oração que fazemos, mas sim o quanto as nossas orações estão de acordo com a vontade de Deus. Portanto, a verdadeira oração não é um meio para fazer Deus concordar conosco, mas um meio para desejarmos e orarmos a vontade de Deus. Deus poderia cumprir sua vontade sozinho, mas preferiu nos incluir no seu plano. Assim como a pregação da palavra de Deus é um meio para que os eleitos sejam salvos, assim também a oração é um meio para que a vontade de Deus seja feita. O próprio Jesus nos ensinou a orar: "Seja feita a tua vontade assim na terra como no céu". A verdadeira oração aqui na terra, nada mais é do que o expressar a vontade de Deus no céu. A oração não altera o que Deus já determinou, mas é o meio de realizar o que já foi preordenado. Não é a terra que comanda os céus, como muitos pensam, mas os céus comandam a terra. Quando nossas orações são determinadas pela palavra de Deus, ele nos ouve.

Veja o que diz João 15:7: "Se permanecerdes em mim, e as minhas palavras permanecerem em vós, pedireis o que quiserdes, e vos será feito."

 O Espírito Santo trabalha a palavra de Deus na nossa mente, mudando os nossos conceitos, e consequentemente, os nossos desejos, e então começamos a orar a vontade de Deus. I João 5:14 confirma esta verdade: "E esta é a confiança que temos para com Ele, que, se pedirmos alguma coisa segundo a sua vontade, ele nos ouve."

Somente tendo a nossa mente renovada pela palavra de Deus é que seremos transformados. Somente a palavra de Deus pode mudar os nossos pensamentos para podermos crer que a vontade de Deus é boa, perfeita e agradável.

O segredo da oração: Saber ouvir

Por mais estranho que nos pareça, o grande segredo para orar corretamente é saber ouvir, e não, saber falar. Assim como uma criança aprende a falar por ouvir o seu pai falar, nós aprendemos a orar, quando aprendemos a ouvir o falar de Deus. Deus nos fala através de sua palavra. A bíblia é o falar de Deus a nós na pessoa de seu Filho, portanto ela deve ser a base principal de nossa oração. É muito importante aprendermos a orar e cantar a palavra de Deus. O salmo primeiro nos diz que o varão bem aventurado é aquele que tem prazer de meditar na palavra de Deus de dia e de noite. Para ouvir precisamos ficar em silêncio se querermos ouvir "quem tem ouvidos para ouvir ouça".

Se o pior cego é aquele que não quer ver, o pior surdo é aquele que não quer ouvir. O silêncio muitas vezes nos assusta, pois o que mais nos perturba não é o barulho de fora, mas o de dentro, e muitas vezes até buscamos barulho exterior para não ouvirmos o interior. Mas na realidade, há uma grande ligação entre o silêncio e a oração.

Oração é relacionamento

Deus é um ser relacional, e nos criou à sua imagem e semelhança, portanto o relacionamento é um fator primordial em nossa vida. O nosso relacionamento com Deus determina nossa saúde emocional, reorganiza nosso mundo interior e determina os nossos relacionamentos pessoais. Os dez mandamentos não são nada mais do que princípios de relacionamentos. Os quatros primeiros são princípios para nos relacionarmos com Deus, e os seis últimos, princípios para nossos relacionamentos com o próximo.

Orar nada mais é do que relacionamento com Deus, é um encontro pessoal e íntimo, que nos transforma cada vez mais à mesma imagem dele. É por isso que a nossa oração não pode ter o objetivo de fazer Deus funcionar para nosso uso, como se ele fosse um computador ou um eletrodoméstico. A verdadeira oração tem como objetivo relacionamento e intimidade, como disse o Teólogo Grego no ano 150 D.c Clemente de Alexandria: "Orar é manter a companhia com Deus."  A oração é um meio, e não um fim em si mesma. Nunca devemos pensar na oração como um meio de conquistar nossos desejos desordenados. Tiago 4:3 nos diz: "Pedis e não recebeis porque pedis mal, para esbanjardes em vossos prazeres." A falta de visão da oração como relacionamento nos conduz ao erro de procurar métodos e técnicas para extrairmos o máximo de Deus. Muitos cursos e ensinamentos de oração parecem nos ensinar como tirar o melhor proveito de Deus. Hoje, somos uma geração de consumo, temos uma mente secularizada, por isso a oração se transformou em um meio de resolver problemas e obter conquistas.

Pensamos na oração como um meio de mudar a vontade de Deus. Foi exatamente o contrário que o filósofo e teólogo dinamarquês Soren Kierkegaard escreveu ele diz: "A oração não transforma Deus, mas transforma aquele que ora. Não oramos a fim de informar a Deus, como se ele ignorasse os eventos e aquilo que estamos pensando ou sentindo. Antes oramos dizendo: "seja feita a tua vontade"."

O maior desejo de Deus não é nos dar coisas, mas o maior bem para nós na mente de Deus é nos conformar à imagem de seu Filho (Rm 8:28,29). Somente através desta transformação é que encontraremos nossa verdadeira humanidade, pois a intimidade com Deus nos libertará de nossas trevas interiores e deixaremos de ser superficiais.

 A superficialidade é a maldição da nossa geração, somos obcecados pelo exterior, somos colecionadores de coisas, e acabamos por nos "coisificar". Temos medo da oração, porque temos medo de nos conhecer, pois na luz de Deus temos luz, e diante da luz tudo se manifesta.

Orar é estar nu diante de Deus, é estar vazio, totalmente dependente da graça. Orar é reconhecer nossos limites, nossa finitude, e reconhecer que somos barro nas mãos do oleiro. Orar é uma demonstração de fé. O professor James Houston diz: "Viver sem orar é finalmente desacreditar de Deus, é perder de vista os mais importantes valores humanos, tal como a fé, a esperança e o amor."

O Espírito e a oração.  A Bíblia afirma que nós não sabemos orar como convém, mas que o Espírito Santo intercede por nós com gemidos inexprimíveis (Rm 8:26,27). A verdadeira oração não está baseada em nosso intelecto, mas em um coração quebrantado e contrito. Quando oramos somente com nosso intelecto, somos tentados a dar direção a Deus, a aconselhá-lo como agir. Mas, Deus pelas suas muitas misericórdias usa vários meios para nos quebrantar, para tratar com nosso coração altivo. Muitas vezes, nos coloca em túneis escuros para que aprendamos a orar de verdade, para nos ensinar a depender do Espírito Santo.

Geralmente nestas horas de profundas crises, nossa boca se cala, mas nosso coração se abre; nossos ouvidos se aguçam e nós paramos de ensinar a Deus, e nos colocamos como aprendizes.

 Nesta escola da oração nós nunca nos diplomamos mas, pelo contrário, cada vez mais clamamos: "Ensina-nos a orar".



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